ANÁLISE – Violência e suas faces

Eu nao vou aqui descrever o que aconteceu nas proximidades de Stuttgart durante essa semana (estudante que matou várias pessoas e depois se matou), mas sim registrar aqui uma análise do “problema”  que eu e meu marido fizemos hoje quando falamos sobre esse ocorrido.

Estou estudando em Reutlingen, uma cidade que está próxima do ocorrido. No dia eu estava indo para a estacao de trem, quando meu telefone tocou. Era meu marido que me ligou pra me perguntar se eu estava bem. Achei estranho e disse que sim e perguntei o por quê da pergunta. Foi entao que ele me explicou o que aconteceu e me disse que o cara fugiu em direcao à Reutlingen e por isso ele ficou preocupado. Naquele momento o rapaz já tinha sido morto, mas o Rô esqueceu de me contar isso e ele precisava desligar, pois tinha recebido uma outra ligacao que precisava atender. Desligamos e eu fiquei branca e estática onde estava por alguns segundos. De repente comecei a andar rápido até a estacao, olhando para todos os lados e morrendo de medo do cara estar mesmo por lá. Chegou o trem e eu entrei. Observei as pessoas dentro do vagao e vi um cara “meio” suspeito, foi entao que decidi descer e ir para o outro vagao. Fiquei neurótica. Todo mundo virou suspeito. Mas gracas a Deus eu nao corria mais risco, mas o trauma ficou.

Ontem fui pra Uni e fiquei pensando como estamos desprotegidos em qualquer lugar para onde vamos. Nao há mais “o lugar seguro” ou “o país seguro”.

No Brasil tivemos esse tipo de problema somente uma vez em um cinema no Morumbi, onde um estudante de medicina saiu atirando em todo mundo que estava dentro do cinema. No Brasil nós temos a marginalidade atrelada (quase sempre) à criminalidade, mas isso pelo menos dá ferramentas para que a polícia evite que algo aconteca, pois o criminoso sempre tem um histórico que deixa rastros sobre seus possíveis próximos passos e às vezes a polícia consegue evitar seus próximos crimes (ou ajudá-lo, enfim).

Nos países desenvolvidos esse problema é muito mais comum, menos nos países asiáticos (até onde eu saiba). Os crimes ocorrem por pessoas com distúrbios psicológicos e, geralmente, sao pessoas “normais” e “indefesas”. É o tipo de crime que nao dá pra prever, pois um aluno com distúrbios pode estar sentado atrás de você numa sala de aula e um belo dia ele resolve que o mundo é cruel e que você tem culpa por isso e “simplesmente” saca uma arma e atira em você. Nao há como se proteger, pois o perigo mora onde você menos espera. E qual é a causa? Acho que é isso que todo mundo se pergunta numa situacao dessas, né!? Eu, pelo menos, me pergunto isso sem cansar. Acho que nesses casos o problema é TAMBÉM (como no Brasil) um problema de cunho social. Geralmente sao pessoas que também se sentem “marginalizadas”, ou seja, à margem da sociedade onde convivem. Esse alemao, por exemplo, estudava em um tipo de escola que é marginalizada aqui na Alemanha, a “Realschule”. Eu já ouvi e li várias vezes que muitas criancas que sao privadas do direito de poder estudar em uma escola melhor (o aqui chamado “Gymnasium”) apresentam distúrbios e uma forte revolta contra o sistema e a grande maioria dos estudantes sao estrangeiros ou filhos de estrangeiros, pois para ter uma vaga no “Gymnasium” é preciso ter super notas em Alemao e Matemática. Mas, por outro lado, também tem muito aluno desse “Gymnasium” que sofre distúrbios talvez devido à forte pressao sobre todos eles para que tenham sempre as melhores notas. Eu já li numa revista alema que uma grande porcentagem dos alunos na Alemanha tem que ser acompanhados por psicólogos, pois a pressao para que tenham as melhores notas é muito grande e o tempo que eles tem livre para se divertir é cada vez menor. A maioria dos pais paga nao só psicólogos, mas também professores particulares para ajudarem seus filhos a estudarem fora da aula.

Resumindo: marginalidade no Brasil e em países fora do chamado “primeiro mundo” leva à criminalidade (acoes de selvageria), já a marginalidade em países mais desenvolvidos leva à acoes irracionais sem cunho criminal (acoes relacionadas à distúrbios psicológicos). As acoes criminais podem ser prevenidas, já as acoes psicopatas só podem ser (no momento que ocorrem) minimizadas (como foi feito pelos professores da escola na Alemanha através de códigos).

No Brasil eu tinha medo de assaltos (os quais posso evitar até um certo ponto tomando certos cuidados), aqui agora tenho medo do inesperado e invisível. O que é pior? Nao sei. Sinceramente. Só lamento pelo rumo que o mundo está tomando. Solucao? Reduzir ou eliminar a marginalizacao de grupos específicos na sociedade e dosar a pressao sobre criancas e adolescentes para que atinjam às expectativas de pais e sociedade, quando eles deveriam estar focados em se desenvolver como seres humanos acima de tudo. Utopia? Eu, sinceramente, acho que sim.

Brasil – Segundo reencontro: retornar é crescer

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No post anterior escrevi, como da última vez, sobre os sentimentos antes de voltar a visitar meu país de coração. Foi bem diferente do post relativo a primeira visita, onde eu fui tomada por um medo incrível de tudo que iria encontrar e de tudo que não iria mais encontrar. Dessa vez sai daqui tranquila e sem nenhuma grande expectativa, nem boa e nem ruim.

Mas o post sobre o retorno será bem diferente do último retorno. Nem melhor, nem pior. Só diferente.

Pisar em solo brasileiro é sempre mágico pra mim. Me arrepia. Me emociona. Sempre. Ouvir nossa língua sendo falada com diversos sotaques é encantador! O Brasil se entende de norte a sul e isso, quando se mora na europa, é mágico de se ver. Um país com tal dimensão onde só existe uma língua oficial! E os sorrisos? E os abraços? E a senhora presenteando um caixa da padaria no Natal? É tanto calor humano, meu Deus! Saudades. É disso, acima de tudo, que sinto saudades.

Da primeira vez que estivemos no Brasil como “turistas” foi tudo muito mágico e cheio de alegria e euforia. Só vi coisas boas, baguncei muito e trouxe comigo um sentimento de euforia gostosa e inesquecível. Mas desta vez fui a fundo em tudo e vi muita coisa boa, mas também muita coisa ruim dentro e fora de mim. As coisas boas fora de mim são as mesmas que vi da outra vez e dentro de mim vi muita coisa boa, principalmente amadurecimento para lidar com pessoas e situações que antes eram um desafio pra mim. Não foi fácil, mas acho que tive sucesso dessa vez. ((-:

O período dessa vez era de férias e, por isso, não pudemos ver muita gente querida que estava viajando e também não pudemos ver pessoas que estavam até mesmo pertinho de nós, pois nós também nos deslocamos bastante. Sendo assim, fiquei muito mais tempo sozinha, andando pra lá e pra cá e observando tudo DE VERDADE à minha volta e, mais uma vez, dentro de mim. O que vi? Bem, vi que vou ter algumas dificuldades quando voltar. Dificuldades que até então eram folclore pra mim.

FORA DE MIM:

– O que mais me assustou foi que senti MUITO medo tanto em Sampa, quanto em Belo Horizonte. Medo do quê? Das pessoas à minha volta, principalmente quando estava no trânsito. Uma agonia desesperadora se instalava dentro de mim nesses momentos. Sério: DESESPERADORA. Era como se eu nunca tivesse vivido ali, mesmo sabendo que vivi – e bem – durante 28 anos naquela loucura. O que me consola, é que pessoas que já passaram por essa experiência dizem que quando voltarmos esse medo todo diminuirá com o tempo e com a rotina. Assim espero, pois não quero sentir “aquilo” de novo. Não quero.

– Da primeira vez que fomos como “turistas” ao Brasil só tínhamos conhecido lugares bonitos e abastados (exceto o Egito), mas dessa vez isso também foi diferente. Antes de ir para o Brasil, dessa vez, fomos ao Quênia (África) e à Romênia. Dois lugares onde vimos muitos problemas sociais e de infra-estrutura. Sem dúvida estou falando de países completamente diferentes, pois a Romênia é um país pobre para o padrão europeu e o Quênia é um país pobre de verdade, ou seja, para os padrões humanitários. Essas viagens nos trouxeram uma visão diferente quando olhamos para o Brasil agora. Em São Paulo vi muitas situações que me lembraram a Romênia (nada tão ruim) e muitas outras que me lembraram o Quênia (algo – agora – chocante pra mim). Percebi o quanto a gente fica “abestado” morando na Europa, pois quando eu fui ao Quênia e a Romênia olhei para essa “pobreza” e ficava impressionada, revoltada, indignada e assustada. Chegando ao Brasil, dessa vez, tive a mesma sensação. De repente eu enxerguei tanta coisa ruim que existe em São Paulo. De repente eu entendi que só quero voltar porque lá estão as pessoas que amo mais que tudo e não por causa do lugar. Só as pessoas me farão voltar. Agora eu tenho certeza disso e fico triste em perceber essa realidade.

DENTRO DE MIM:

Errei. Estou errando e errando muito. Como assim? Pois bem, eu NUNCA tive vergonha de voltar atrás e dessa vez não é diferente. Percebi que a minha “aversão” à cultura alemã só me trouxe atraso e falta de um real aproveitamento estando por aqui. Justo eu que odeio pré-conceitos. Odeio e estou sendo esse tempo todo uma dessas pessoas “pequenas” que se acham melhor ou mais capazes que as demais à sua volta, não importa aonde estejam. Da última vez já tinha me proposto a aceitar melhor as coisas, mas eu falhei. Sinto que na verdade eu só estava me escondendo de mim mesma, com vergonha de assumir que admiro SIM muita coisa nessa cultura e nas pessoas que aqui nasceram. LÓGICO, que tem MUITA coisa (assim como no Brasil) que ODEIO aqui e isso não vai mudar, mas isso NAO justifica eu me fechar e tirar a chance deles me mostrarem o que há de bom e eu de aceitar que isso também é bom pra mim.

Por isso, respondi dessa vez que não sei exatamente quando voltaremos, embora tenhamos uma previsão de voltar, no mínimo, no começo de 2010. Mas eu NAO QUERO MAIS fechar portas e janelas. Não quero mais dizer que “não aguento mais” e assim desperdiçar possibilidades, pois se eu permanecer nessa linha energética, elas não irão aparecer MESMO pra mim. EU NAO QUERO MAIS ser preconceituosa e pequena. Não quero. Cansei. Lutei contra meu destino e só eu perdi até agora. Não quero mais perder. Quero vencer e pra isso é preciso aceitar minha condição atual e permitir que ela se mostre favorável e enriquecedora. É isso. Retornar é crescer mesmo e de verdade.

Como me escreveu uma amiga peruana sobre uma frase de Che Guevara: “Nosso país nao é necessariamente onde nascemos, mas sim onde nos realizamos.”

Ou ainda como disse um amigo do Rodrigo: “Você não pode julgar um país pelo seu povo, mas sim pelas pessoas que ali nasceram e que VOCÊ CONHECE.” Se for assim, eu JAMAIS julgaria mal a Alemanha, pois, até agora, praticamente só conheci de verdade pessoas maravilhosas que vem nos ajudando e muito no processo de integração. Elas são diferentes de nós, mas são pessoas boas e é isso que deve contar.

É isso. Leiam o post do primeiro retorno, somem a este e terão uma visão positiva e negativa sobre o Brasil, ou, talvez fosse melhor dizer, sobre São Paulo (afinal não conheço o Brasil como um todo, principalmente o eixo norte). E terão também uma visão do meu encanto sobre Brasil e Alemanha e também o meu desencanto sobre os mesmos.

Isso porque TUDO tem um lado bom e um lado ruim e é disso que vem o equilíbrio de qualquer sistema. E o nosso equilíbrio só é alcançado quando alcançamos maturidade suficiente para enxergar as coisas como elas são e não como gostaríamos que elas fossem. É a partir dessa visão, que conseguimos, enfim, integrar o sistema e viver em harmonia conosco e com ele. É assim que penso HOJE e é a partir de agora que quero viver assim.

Sobre os momentos que passamos com nossos amigos e familiares, só tenho um milhão de coisas a dizer, mas principalmente: AMEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEIIIIIIIIIIIIIIIIII !!!!! São vocês que fazem cada viagem de volta valer a pena, de verdade! Se não fossem vocês eu talvez não quisesse tanto voltar (o que classifica vocês como culpados também…hehehe). Quando encontro com minha família e meus amigos eu me encontro comigo mesma e é ai que consigo resgatar tantas coisas boas e decidir eliminar outras um pouco ruins pra mim e pra vocês. Vocês são os maiores responsáveis pelo meu amadurecimento e pelo meu “não endurecimento”. E, aproveitando que o Che tá na conversa, ele mesmo resume isso: “Hay que endurecer-se pero sin perder la ternura jamas!”

Esse retorno está sendo intenso, mas profundo. Me sinto BEM diferente e não me perguntem como, pois às vezes acho que o ser humano ainda não definiu todos os sentimentos e eu me vejo em um momento onde os sentimentos não tem nome. São sentimentos tão intensos e verdadeiros que talvez não sejam mesmo passíveis de definições humanas, afinal chegam a ser divinos e não humanos.

Saudades de todos e desejo que todos um dia se encontrem onde quer que seja, pois não importa o lugar, mas sim as as pessoas e as oportunidades que ele te oferece e a sua capacidade de enxergá-las e aproveitá-las.

Sucesso hoje e sempre pra mim e pra vocês! (((-:  E… até a próxima!!!